Como nascem as paixões…

Um Porsche de 290 cavalos e apenas 3 quilômetros: basta uma experiência única para que a paixão por automóveis entre em ignição

porsche 911 turbo 3 3 coupe us s
Porche 930: a máquina! (Foto: Divulgação)
Por AutoPapo
Ricardo Prado, colunista convidado
Publicado em 09/11/2025 às 19h06
Atualizado em 10/11/2025 às 18h09

Tive o privilégio de crescer em uma cidade pequena do interior de São Paulo e me lembro de ir para a escola caminhando. Todas as tardes, ia ao clube de bicicleta para os meus treinos de natação. Durante esse trajeto – que fazia acompanhado da minha irmã Rosamaria –, ia observando as casas (todas muito parecidas) e, principalmente, os carros.

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Era o início da década de 1970 e os automóveis eram dos modelos Fusca, Variant, Corcel, Belina, Chevette e… ah! Opala. Além, claro, da clássica Veraneio – tinha uma história que, supostamente, ao comprar um exemplar, ganhava-se uma geladeira, imagine isso? – e do rei de todos: o Dodge Charger. Nesse caso, um verde-tropical com capota de vinil pertencia a um vizinho engenheiro, transplantado para Andradina para trabalhar na construção da Usina de Ilha Solteira. Eu gostava, também, de uma casa onde na garagem ficava uma Kombi Tala Larga…linda!

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Lembro-me, claramente, de uma manhã em que fui acordado para correr até a esquina de casa, onde em alguns minutos passaria um caminhão-cegonha com os primeiros Dodge Polara, que seriam entregues nas concessionárias da região. Era um sedã médio da Chrysler, fabricado no Brasil entre 1973 e 1981, derivado do inglês Hillman Avenger. Veio primeiro com motor 1.5, depois 1.8, e tinha versões SE e GLS. Para nós, representava uma novidade: foi o último carro da marca produzido aqui antes da venda da operação para a Volkswagen.

A Rural da família

Desde pequeno sempre gostei de carros – grandes, pequenos, caros e baratos. Adorava a perua Ford Rural azul do meu pai, em que cabiam pai, mãe e os cinco filhos; eu, o caçula, ora ia à frente com minha mãe, ora me acomodava depois do segundo banco, junto às bagagens, bem lá atrás. Essa Rural marcou a infância de muita gente da minha geração. Lançado pela Willys-Overland em 1958 e incorporado à linha Ford em 1967, era um carro versátil: podia ser 4×2 ou 4×4 e ganhou motor de seis cilindros nas últimas gerações.

Resistia ao campo, servia à cidade e tinha espaço para toda a família. Foi produzido até 1977 e ficou como um ícone de uma época em que carro era também sinônimo de convivência. Na sequência, tivemos uma VW Brasília, de um tom de verde estranho e com o motor no lugar das bagagens… e lá se foi o meu espaço pessoal!

willys rural divulg
Rural marcou infância!

Aos 12 anos, mudamos para São Paulo e não tínhamos mais carro. Então, eu andava de ônibus para cima e para baixo. Morava na região da Augusta e pegava o ônibus elétrico em direção ao Shopping Iguatemi, pois o Clube Hebraica, onde nadei durante três anos, ficava logo atrás. Quando descia do ônibus no ponto do shopping, em vez de olhar lojas, sempre preferia andar pelo estacionamento para admirar os diferentes modelos de carros: algumas Mercedes, Opalas com quatro portas — carros que não tinham em Andradina. Era uma época onde havia alguns poucos carros importados. Todos inacreditáveis!

Nesse meio tempo, eu já havia participado de campeonatos sul-americanos e até mesmo de Jogos Pan-Americanos, e vislumbrava uma participação nos Jogos Olímpicos. Para isso, consegui um contato e uma vaga em um clube na Califórnia, em uma cidade pequena ao sul de Los Angeles. Não hesitei, aos 15 anos, em março de 1980 – sem falar inglês, sem conhecer ninguém e com pouquíssima grana –, em embarcar em um voo da Pan Am para os Estados Unidos.

Outro mundo!

Fui treinar em um grande clube norte-americano. Lá passei a treinar o dobro do que estava acostumado e fui exposto à cultura estadunidense do automóvel: Honda, Toyota, Subaru, Isuzu, Mitsubishi; muitos modelos da marca Chevrolet e das alemãs Porsche, Mercedes, BMW; além dos primeiros da marca Audi (nunca havia visto ou ouvido falar).

Toda casa tinha dois carros na garagem e mais um ou dois estacionados na calçada; todo mundo mexia nos carros em casa mesmo… Nunca havia visto nada parecido antes.

Os dois treinos diários ocuparam minha mente o suficiente para que o interesse e a curiosidade pelos carros ficassem um pouco esquecidos. Com o novo programa de treinos, um mês após minha chegada, já havia melhorado meu tempo o suficiente para me classificar para os Jogos Olímpicos de Moscou.

Essa primeira competição olímpica foi uma experiência que ditou o restante da minha carreira: nadei minha prova, 400 metros medley, e consegui a 11ª colocação. Fiquei nas eliminatórias, porém, vi que o russo que se sagrou campeão era basicamente igual a mim – mais alto, mais forte, mais velho, mais experiente… mas, basicamente, igual a mim. Portanto, se ele conseguiu, sei que poderia conseguir também!

Rotina nos EUA

Voltei para a Califórnia e, ao início do ano letivo, comecei a estudar no High School.  Entrei no 11º ano e passei a encarar um dia a dia duríssimo: treino um, das 5h15 às 7h30; escola das 8h20 às 14h15; treino dois das 14h30 às 18h00. Morava em uma casa de família que o clube conseguia para os atletas, pagava US$ 300 por mês para a família, mais 50 dólares de mensalidade do clube e era responsável por todas as despesas com viagens e competições…

Quando tudo mudou…

A vida era difícil com escola e treinos e quase nada de diversão. Mas, tudo meio que mudou no dia que a minha carona para o treino não apareceu – e tive que ligar para o treinador Mark Schubert, que respondeu:

– Aguarda aí que estou indo te buscar…

Minutos depois, eu ouço um rugido rústico, alto e descontrolado virando a esquina. Eis que me aparece o Mark Schubert para me buscar em um Porsche 930 Turbo, modelo gray market alemão, cor bronze metálico. Sentei no banco do carona e voamos pelo trajeto de pouco mais de três quilômetros… 290 cavalos em um modelo seis cilindros turbo, nunca antes disponível em mãos amadoras! Não consegui pensar em mais nada naquele dia… Nascia, ali, uma paixão que me move até os dias de hoje.

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