Lecar: carro dos sonhos pode virar pesadelo 

Ele só anunciava a produção. Mas, agora, nem fábrica tem e já está vendendo seu “carro” e até concessão para revenda

Lecar Campo projeção frente parada
Lecar Campo é o segundo modelo que a marca já vende aos aventureiros (Fotos: Lecar | Divulgação)
Por Boris Feldman
Publicado em 06/09/2025 às 09h00

O empresário capixaba Flavio Assis ficou rico ao vender seu cartão de crédito Le Card e decidiu realizar o sonho de produzir um automóvel que chamou de Lecar. Seria elétrico e por isso ele se autodenominou Elon Musk brasileiro. Mas sem tecnologia e nem capital, pois explica que vai recorrer a financiamento do governo e lançamento de ações. O Lecar é mais um projeto dos inúmeros brasileiros que naufragaram: a IBAP que fez o Democrata, a Óbvio, a Emme/Lotus, a NDR, a Bravo Motors e até o Gurgel que quebrou quando decidiu brigar com as poderosas multinacionais.

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O Sr. Assis está perdido no tempo e no espaço pois seu elétrico que seria produzido no Rio Grande do Sul já virou um híbrido e com fábrica a ser construída no Espírito Santo. Aí mudou de idéia e decidiu produzir o carro na China. Mas desfez as malas e ficou em sua terra natal mesmo. O visionário Flávio diz que vai produzir 120 mil unidades por ano, mais que as chinesas que estão se instalando no Brasil. É investimento para mais de bilhão de reais.

Apresentou o carro-conceito (em gesso), um sedã, depois uma picape (Campo) e anunciou estar estudando também um terceiro modelo, um SUV (Tático). Seu híbrido não tem nada – como ele afirma – de revolucionário: a mesma mecânica do BMW i3 ou da e-Power da Nissan. Apresentado pela primeira vez em 1901 por um engenheiro chamado Ferdinand Porsche.

O chamado híbrido em série: um motor a combustão acionando um gerador que carrega uma bateria que movimenta os motores elétricos. Neste conceito, a idéia é que o motor seja de baixa cilindrada e sem nenhuma sofisticação para ser barato e de baixíssimo consumo, operando a uma rotação constante. O projeto do Lecar já começou errado pois pretende instalar um motor da Horse, que equipa no Brasil os carros da Renault. Sofisticado e turbinado…

Consumo de carcaça

Não tem fábrica nem carro. Mas já tem até consumo declarado. E com precisão: 33,3 km por litro de etanol. Onde encontrou estes valores se nem protótipo existe? Um modelo (mock-up) já foi exposto num evento do interior de São Paulo. Uma rudimentar carcaça em que as rodas sequer viravam. Mas a marca já tem estande reservado no Salão do Automóvel de São Paulo.

LECAR 459 PRATA PROTOTIPO FRENTE
De gesso, massinha ou digital, o carro da Lecar é tudo, menos real

Ele afirma já ter contratos para fornecimento de componentes com empresas de peso no setor. Mas contrato não é difícil estabelecer: complicado é ter caixa para pagar milhares de peças…

A Lecar provavelmente vai construir alguns protótipos, como outros fizeram. Para obter um financiamento do governo. Ou interessados em adquirir ações da empresa. A fábrica será no Espirito Santo mas, interessado no prédio abandonado em Jacareí (SP) pela Caoa, já tenta receber milhões da InvestSP, órgão de financiamento do estado de São Paulo.

Por enquanto, era apenas sonho. Agora…

O sonho é livre. Mas mudou de figura quando tentou cobrar 1% do valor do carro (1.600 reais) para reserva das primeiras unidades. Não deu certo: apareceram poucos otár…, ou melhor, voluntários. Agora o tiro é de maior calibre: quer atrair concessionárias e anunciou, numa live na semana passada, as condições para qualquer dono de um negócio se tornar parceiro. Bastam 15 mil reais para o material de marketing e a compra programada de um carro em 48, 60 ou 72 meses. O futuro concessionário o receberia ao quitar a metade do valor. Se tiver carro e fábrica…

Falta o Elon Musk das Arábias explicar muita coisa: como entregar os primeiros carros em agosto de 2026 se não tem sequer um protótipo? E quantos meses para testar os modelos pré-serie? E para homologar o carro? Impossível em menos de 24 meses.

E o capital para montar uma fábrica capaz de produzir 120 mil unidades por ano? De onde virão centenas de milhões de reais? Do BNDES? Do InvestSP? De um IPO (oferta pública de ações)? E ele sabe que a Tesla perdeu milhões de dólares durante anos até se tornar rentável?

Assistência técnica? Não é problema para ele, apenas para as idiotas das grandes empresas. Como a GM, Ford, Volkswagen e Fiat não pensaram em, como ele, montar centros regionais para atender seus clientes?

Enquanto era sonho, não machucava ninguém. Mas agora ele pode virar pesadelo no bolso de muitos.

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1 Comentário
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Santiago 6 de setembro de 2025

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