Maio Amarelo: para evitar o desonroso pódio no ranking mundial

"A diferença é que esta é uma guerra que podemos encerrar hoje, com uma simples mudança de atitude ao compartilharmos o espaço no trânsito”

acidente de onibus corpo de bombeiros
Brasil ocupa o terceiro lugar em mortes no trânsito, com mais de 40 mil óbitos todos os anos (Foto: CBMDF | Divulgação)
Por Boris Feldman
Publicado em 10/05/2025 às 09h00

A campanha Maio Amarelo, criada em 2014 pelo Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV), é das mais objetivas ações para reduzir o mar de sangue nas nossas ruas e rodovias. Lamentavelmente, poder público, sociedade e imprensa já banalizaram os mais de 100 mortos diariamente por acidentes de trânsito no Brasil. Se cai um Boeing com 200 passageiros, há uma  comoção geral e manchetes no país e no mundo. Mas, ninguém se sensibiliza com um Boeing que cai cada dois dias nas estradas, cerca de 40 mil mortos por ano. A rigor, o número correto é ainda maior, pois as estatísticas são falhas e só consideram os mortos no local do acidente e ignoram os falecidos em hospitais nos dias seguintes.

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Nas rodovias, acidentes com ônibus fazem dezenas de vítimas, entre feridos e mortos. Se é um acidente previsível, então é morte anunciada! Pois às vezes, ainda se levanta a questão de um defeito técnico ter sido responsável. Em geral, freios ou pneus. Ou a sonolência/cansaço do motorista. Mas jamais se levantou a questão dos cintos de segurança, raramente afivelados em viagens intermunicipais ou interestaduais.

O condutor, antes de deixar a Rodoviária, anuncia lá, na frente, sua obrigatoriedade. E não deveria partir se algum passageiro desrespeitasse a legislação. Mas, se assim o fizesse, seria duramente criticado (ou vaiado…) pela maioria.  Entretanto, se algum policial rodoviário surgisse eventualmente durante o trajeto e o multasse por desrespeito à legislação (sim, seu cinto estava afivelado, mas ele é infrator se não exigir o mesmo dos passageiros), as estatísticas dos acidentes – ou de suas consequências –  seriam bem diferentes.

Diz José Aurélio Ramalho, presidente do Conselho do ONSV: “Na guerra, mata-se por ódio ou ideologia. No trânsito, estamos matando por pressa, distração ou irresponsabilidade – e o mais trágico: estamos matando gente como nós, sem saber. A diferença é que esta é uma guerra que podemos encerrar hoje, com uma simples mudança de atitude ao compartilharmos o espaço no trânsito”

O motorista é o grande responsável pela maioria dos acidentes: irresponsabilidade, embriaguez, cansaço, doença, drogas, desatenção e outros fatores contribuem para a tragédia rodoviária. Mas também o poder público, pela indiferença em relação às suas obrigações:

Inspeção veicular – Está desde 1998 no Código de Trânsito Brasileiro a obrigatoriedade de ser implantada. Para evitar a circulação de veículos sem mínimas condições de segurança. Mas o governo não tem coragem de obrigar seus donos a sucateá-los, pois seriam milhões de votos perdidos na eleição seguinte. E tome carros aos frangalhos circulando e colocando em risco a própria vida e a de terceiros. Enguiçados na via pública provocando extensos congestionamentos. Ou poluindo a atmosfera com emissões desproporcionais.

Manutenção

O buraco na estrada, além de danificar o veículo, pode também provocar acidentes pois o obriga a desviar e atingir outros usuários da rodovia.

Fiscalização

blitz policia
Intensificação da fiscalização nas estradas reduziria o número de veículos circulando de forma irregular (Foto: PMMG | Divulgação)

É rigorosamente precária, quase inexistente. Ninguém se preocupa em seguir a legislação, certo da impunidade. E roda com películas (insulfilm), verdadeiros “sacos de lixo” que perturbam a visibilidade noturna. No caso de chuva, não só prejudicam, mas quase eliminam a visão do motorista. Pneus “carecas” não são importunados e circulam à vontade. Escapamento com excesso de decibéis afrontam nosso sistema auditivo. E à noite ainda se verifica a ausência de lanternas na traseira ou “caolho” na dianteira.

Cadeirinhas

É absurda a leniência do poder público que, mais de dez anos depois de implantada, ainda não regulamentou a legislação das cadeirinhas para crianças em vans escolares, táxis, nem ônibus. Pois sofre uma enorme pressão dos fabricantes destes veículos, que teriam de fazer grandes investimentos para atender as exigências da lei.

Faixa Azul

Acidente de moto
A grande maioria dos acidentes de trânsito envolvem motocicletas pela falta de interesse das autoridades em implementar instrumentos como a faixa exclusiva (Foto: Shutterstock)

De cada 10 atendimentos do SUS, seis são motociclistas vítimas de quedas e acidentes. Foram criadas na cidade de São Paulo, em 2021, as faixas exclusivas para as motos. E concedidas autorizações provisórias para outras cidades. O Senatran, responsável pelo assunto, ainda não forneceu números, estatísticas nem relatórios sobre a chamada “Faixa Azul”, que permitiriam sua regulamentação definitiva. Informações não oficiais adiantam que elas proporcionaram uma redução de acidentes. A demora do órgão de trânsito em sua padronização é responsável por mortes desnecessárias em milhares de outras vias públicas que poderiam adotá-las.

Luz de Alerta

Outras ações governamentais (traçado, proteção, guard-rails, sinalização, etc) poderiam abrandar este absurdo número de acidentes – e suas graves consequências. Nossas autoridades de trânsito comprovadamente não se comoveram com a luz vermelha acesa há tempos pelas estatísticas. Mas quem sabe se sensibilizariam diante da amarela, um alerta para evitar que o Brasil, hoje em terceiro lugar no ranking de acidentes de trânsito, conquiste a mais que desonrosa e indesejada liderança mundial.

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Santiago 11 de maio de 2025

No caso dos cintos em ônibus rodoviários, não é justo responsabilizar o motorista pelo desleixo daqueles que recusam-se a afivelar o cinto.
O motorista tem sim o dever de anunciar obrigatoriedade do cinto a cada inicio de viagem, bem como tal obrigatoriedade deve estar afixada em avisos bem visíveis aos passageiros.
Porém obrigar ao motorista que ele obrigue os passageiros a afivelarem os cintos, aí tambem não. Conhecemos a realidade do nosso mundo, aonde por muito menos se é hostilizado, ofendido e até gravemente agredido.
Deve-se sim ajustar a legislação, a fim de atribuir ao passageiro a responsabilidade pelo uso do cinto, bem como ele compartilhar as responsabilidades das consequências pelo não uso do dispositivo.

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