Por que era previsível uma única e solitária estrela na avaliação de segurança do SUV produzido pelo grupo Stellantis?
O Latin NCAP é uma entidade uruguaia que testa carros comercializados na América do Sul e Caribe para avaliar seu nível de proteção aos ocupantes no caso de acidentes. E atribui de zero a cinco estrelas de acordo com os resultados, aferidos em crash-tests.
Ao empunhar a bandeira da segurança, o Latin NCAP conquista a simpatia do consumidor e da imprensa, mas com critérios muito mal-explicados: como se decide avaliar um modelo, porque sobe a régua das exigências mesmo durante o desenvolvimento de um novo automóvel, quais os valores dos critérios objetivos (crash-tests) e subjetivos (eletrônica) na pontuação final de segurança, etc.
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Os resultados dos crash-tests são publicados por alguns veículos de comunicação que não investigam e nem questionam seus critérios. E o pior, até o Ministério Público Federal já se deixou enganar e pediu à Justiça uma ação contra a GM exigindo um recall e indenização (de R$ 2,5 bilhões) por falhas no Chevrolet Onix produzido entre 2012 e 2018, baseado nos testes da entidade uruguaia.
Como se o Latin NCAP fosse homologado ou credenciado pelo governo brasileiro para certificar modelos comercializados no nosso mercado. Ignorando a existência de legislação específica para enquadrar os carros vendidos no país dentro de normas brasileiras.
O caso do Jeep Renegade “panamenho” foi bem significativo para evidenciar os caminhos tortuosos seguidos pelo Latin NCAP. A entidade o adquiriu em 2023 numa concessionária Jeep daquele país e informou à fábrica no Pernambuco que planejava testá-lo.
A Jeep informou que aquela unidade estava desatualizada, era resto de estoque e ofereceu um modelo recém-fabricado para avaliação. Os uruguaios disseram que aceitariam, mas que a fábrica deveria patrociná-los pagando 500 mil euros. Pedido negado e o teste foi então realizado com a unidade obsoleta. Das cinco estrelas concedidas ao Renegade em 2015, quando lançado, sobrou apenas uma devido aos novos padrões estabelecidos.
Outras marcas da Stellantis (Fiat, Citroën, Peugeot) foram também massacradas pelos uruguaios. Na semana passada, o Peugeot 2008 foi contemplado com apenas uma estrela.
Fica escancarado que o Latin NCAP não trata com imparcialidade as marcas. A versão original do VW Virtus produzida no Brasil recebeu cinco estrelas. Depois, testou uma nova versão fabricada na Índia, também aprovada.
E a nova produzida no Brasil? Neste caso, os uruguaios não acharam necessário realizar testes, apenas uma “auditoria” para comprovar que o modelo brasileiro recebera as mesmas alterações introduzidas na India, como se os componentes do carro indiano fossem idênticos aos nosso.
A Hyundai foi outra prejudicada com o “teste” do HB20. À época de seu lançamento, aprovado com quatro estrelas, mas, uma segunda unidade, testada meses depois, perdeu três delas, apesar de os protocolos não terem sido alterados. Como explicar?
O relatório da entidade uruguaia, subjetivo e de rigor técnico questionável, diz “não ter encontrado diferença na construção dos dois veículos”. Alejandro Furas, do Latin NCAP, afirma textualmente que o segundo carro teve mesmo comportamento que o primeiro. Mas alega que o rebaixamento estelar “em princípio, explica-se pela diferença no comportamento do painel interno plástico da porta frontal”. E a drástica redução de três estrelas.
O engenheiro Furas se investe de autoridade para repreender a Hyundai (e outras fábricas brasileiras) por oferecerem carros com menor nível de segurança que na Europa. Revela também um raro domínio de especialista em manufatura e processos industriais, pois insinua “oscilação na qualidade da produção”.
A Hyundai, perplexa, questiona o disparate dos resultados: “Não houve qualquer mudança no processo de produção ou na especificação do veículo que possa justificar a extrema variação entre os dois testes realizados pelo Latin NCAP em menos de um ano”.
Também o jornalista argentino Martin Simacourbe (AutoWeb) estranhou o procedimento do Latin NCAP e fez duras críticas aos uruguaios. Ele indaga o porquê da súbita mudança de critério: “Recentemente um Chevrolet Tracker recebeu cinco estrelas mesmo apesar de um incêndio durante os testes, o que jamais teria sido perdoado em outro modelo”.
Martin ressalta que a nova vítima dos uruguaios é a Stellantis e suas suspeitas se confirmaram há alguns meses, a partir do teste estapafúrdio com o Jeep Renegade encontrado no Panamá. Ele aponta objetivamente que “a régua não é a mesma para todas”, pois os uruguaios acusaram a Jeep de anunciar um teste realizado há mais de cinco anos mas “se esqueceu” de que a Volkswagen fez o mesmo com o Virtus na Colômbia.
Martin Simacourbe encerra sua excelente matéria afirmando que “há tempos tenho a sensação de que o Latin NCAP denuncia quem tem vontade de denunciar (motivado sabe-se lá porquê) e não pela realidade dos fatos. Eles devem ter suas razões para este procedimento. Mas eu tenho as minhas para pensar que nem tudo é tão altruísta como nos vendem”.
A sensação deixada no argentino é a mesmo em vários jornalistas brasileiros. Os casos apontados aqui deixam a impressão de que pode haver uma relação entre estrelas e patrocínio do teste. Questionadas, a Stellantis declarou formalmente não pagar por eles, enquanto a Volkswagen prefere não comentar o assunto. A rigor, as entidades do sistema NCAP (existem várias pelo mundo) informam que as avaliações podem ser decididas por elas mesmas ou serem patrocinadas pelo fabricante.
O que falta à Latin NCAP é transparência em seus critérios e deixar claro (junto aos resultados) se os testes foram pagos ou não pelo fabricante.
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Nota com patrocínio de 500mil e nota sem patrocínio de 500mil? Kkkkkk Parece até autarquia BR…
Se a coisa está funcionando nesse nível, seria como pegar referências sobre alguém perguntando ao vizinho malandro e fofoqueiro.
Aos amigos, tudo, aos inimigos, a lei!
E para ser inimigo, basta recusar “patrocinio”.
Aos amigos do rei, tudo, aos inimigos? A lei. Ou algo parecido!!!
Si hay gobierno, jo soy contra!!!