O teto solar deixa a luz entrar e resfria o chifre?

A Volkswagen lançou o Fusca com teto solar pensando que aqui as vendas seriam mais retumbantes, mas os maldosos de plantão o associaram aos "cornos".

tetosolar
Por Douglas Mendonça
Publicado em 10/09/2018 às 20h30

Esse modismo do teto solar não vem de agora. Alguns carros europeus dos anos 50 já dispunham desse descolado recurso que, realmente, dá um charme todo especial ao carro: permite clarear o ambiente interno do veículo. Também traz a luz do sol para dentro do carro – muito útil principalmente no início da primavera europeia quando o frio ainda incomoda – e dá realmente um ar descontraído, que lembra um passeio ou fim de semana. Muito legal!

No Brasil, o primeiro carro produzido por aqui em 1956, o Romi Isetta, oferecia essa versão descontraída, pensando no público jovem que também deveria comprar o pequeno e econômico veículo. Não era o teto solar sofisticado de hoje, aquele com comando elétrico, cheio de mandracarias. Na época, tínhamos um teto solar mais rústico, aquele feito de um material plástico impermeável que se dobrava automaticamente quando aberto. Não era uma maravilha tecnológica, mas funcionava muito bem.

Mas, aqui no Brasil, veio a malícia e as piadas de mal gosto dos brasileiros. Não demorou muito para que começassem os comentários maldosos de que o teto solar era um recurso utilizado por homens cujas esposas, noivas ou namoradas não eram muito fiéis e que popularmente eram chamados de corno. Diziam que à medida que as mulheres os traíam, chifres (ou cornos) iam crescendo em suas cabeças.

E como machos raivosos, poderiam utilizar essas presas para correr atrás de outros machos que cortejassem as suas mulheres. Claro que esses motoristas com as cabeças enfeitadas pela galhada não poderiam entrar em seus carros, pois o teto atrapalharia. Por isso, o ideal para esses homens eram carros com teto solar. Pronto, estava criada a lenda de que carros com teto solar serviam para homens chifrudos – ou cornos se você assim o preferir.

Chega a ser impressionante, como uma ideia tão boa passou a ser tão mal vista pela sociedade. Mas não se assuste: essa cultura era muito forte lá em meados dos anos 60. Pois, atualmente, ninguém fala mais sobre isso.

Vamos ao causo deste episódio. Exatamente no meio da década de 60, mais precisamente em 1965, a Volkswagen resolveu lançar por aqui uma versão caprichada do Fusca com teto solar. Não aquele mixuruca de material plástico do Romi Isetta, mas um teto de chapa, na cor do carro, que quando fechado deixava ver apenas um leve contorno retangular de seu formato. E olha que era preciso prestar atenção para ver que aquele carro tinha teto solar, de tão perfeito que era. Aqueles caprichos da engenharia alemã.

No material publicitário de campanha de venda dessa versão descolada do Fusca, as agências de publicidades colocavam o carro na praia com a família, ou fazendo piquenique no campo, sempre em condições de lazer e alegria da família ou de jovens, deixando muito claro a descontração da versão equipada com teto solar. A Volkswagen lançou essa versão aproveitando o sucesso que fazia pela Europa e pensando que aqui as vendas seriam mais retumbantes, pois somos um país tropical cheio de sol e calor. Mas a desgraça caiu sobre o simpático carrinho: imediatamente, os maldosos de plantão o associaram aos “cornos”.

Fusca com teto solar não emplacou
Foto Reprodução

Pronto, a desgraça estava feita! Ninguém queria comprar o Fusca com teto solar para não ser associado a nenhum tipo de chifre ou galhada. Acreditem, o carro começou a encalhar nas concessionárias, por mais bacana que parecesse a ideia. Tenho um amigo, o Antônio Carlos Machado, na época com cerca de 10 anos de idade, e hoje um proeminente engenheiro que fez cursos de especialização em sua área de atuação na Alemanha, Inglaterra e Itália. Seu pai, o português Horacio Augusto Machado, foi, no final de 1965, à concessionária Brasilwagen comprar um Fusca zero-quilômetro para a família.

Chegando no show room da concessionária, ele, garoto, foi olhar os diversos carros lá expostos, maravilhado com as novidades e a diversidades de cores. Enquanto aguardava atendimento, Seu Horacio, como era chamado por nós, em um dado momento estava ao lado de um Fusca com teto solar e o equipamento estava fechado.

Meu amigo Antônio Carlos entrou no citado Fusquinha extasiado pela novidade e pelo cheiro de carro novo e notou a pequena alavanca no teto. Como toda criança curiosa, foi mexer e descortinou-se a grande novidade: bastava girar a manivela e o teto do carro abria. Uma verdadeira mágica! Sua escolha de garoto estava feita: o pai iria comprar aquele carro espetacular. Ele já se imaginava passeando com o pai, em pé no banco com a cabeça para fora do teto sentindo a brisa bater em seu rosto. Chamou a atenção do Seu Horacio e dizia: “Pai, olha só isso, vamos comprar esse Fusca!”.

Experiente comerciante de negócios, Seu Horacio não dizia nada, apenas com o dedo indicador em riste fazia sinal negativo para os apelos do filho. Certamente o experiente comerciante português já havia ouvido falar em seu comércio qual era a utilidade do teto solar e não queria nem ouvir falar sobre desfilar em seu bairro na zona norte com um Fusca de teto solar aberto. Sabia as piadas que, sem dúvida, ouviria dos amigos.

Meu amigo, na época garoto, insistia com o pai para que ele viesse olhar aquela maravilha. Mas Seu Horacio nem perto do carrinho queria chegar. Deveria haver até mesmo a preocupação de algum amigo ou conhecido flagrar Seu Horacio perto do Fusca de teto solar e a partir daí virar alvo de piadas.

Hoje, meu amigo Antônio Carlos entende tudo que aconteceu naquele tempo, mas, ainda garoto, com 10 anos de idade, nunca conseguiu entender porque o pai fez questão de comprar um Fusca normal sem o teto solar e ter de esperar um mês pela chegada do carro que não tinha no estoque da loja. Aquele do teto solar? Tinha vários! Além daquele em exposição, outros no pátio esperando pelos compradores.

Não é preciso dizer que não existiu Fusca 1966 com teto solar. Essa raridade limitou-se a 1965, quando foi desgraçadamente caluniado pela opinião pública da época. Hoje, carros luxuosíssimos mostram o equipamento com acionamento elétrico em uma clara demonstração de versatilidade de design das novas carrocerias. E o pobre Fusquinha, coitado, foi difamado por estar tão a frente do seu tempo. Vai entender!

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7 Comentários
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Cursos Online 23 de maio de 2020

Olá aqui é a Carmen Silva, eu gostei muito do seu artigo seu conteúdo vem me ajudando bastante, muito obrigada.

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Hirckson Martin 11 de setembro de 2018

Tenho um e estou restaurando, pois o teto foi soldado.
Infelizmente não se encontra peças no Brasil.

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Pedro 11 de setembro de 2018

Tenho um mesmo só que alemão e também fecharam o teto solar
É uma vergonha do brasileiro naquela época
E dor de cabeça atualmente para quem tem um Fusca pra reformar com esse teto

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Celio* 11 de setembro de 2018

“Mas, aqui no Brasil, veio a malícia e as piadas de mal gosto dos brasileiros”.
Mau gosto, por favor.

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Bemnéle, bomu. 28 de setembro de 2019

Valeu Professor Pasquele.

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Adolfo 10 de setembro de 2018

Realmente uma pena! Adoraria encontrar um original para restaurar.
A propósito, aqui no sul era conhecido como CornoWolks

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carlos 10 de setembro de 2018

hoje ainda é um acessório como opcional caro, porem um charme a mais e uma esportividade para aqueles que curtem a vida.

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