Olha a calota do seu carro caindo aí, moço! Corre para pegar!
"A brincadeira com os desavisados consistia em jogar uma velha calota metálica quando o carro passava por nós"
"A brincadeira com os desavisados consistia em jogar uma velha calota metálica quando o carro passava por nós"
Dessa vez, não vou dar nomes aos bois. Este “causo” sobre calota de carro é pura brincadeira de moleque, mas dava dor de cabeça para muito motorista marmanjo, que se via enganado feito um patinho pela molecada da rua em que eu vivia quando era garoto, em São Paulo. Isso ocorreu lá pelos idos de 1965!
Quando juntavam-se de 6 a 10 moleques, de 10 a 12 anos de idade, lá no bairro do Cambuci, onde cresci, já se sabia que coisa boa não viria. Mas dentre todas que aprontávamos, uma das mais divertidas, que chamávamos de golpe da calota, fazia muito motorista, de todas as faixas etárias, correr para recuperar a calota de seu carro.
A brincadeira com os desavisados consistia em jogar uma velha calota metálica quando o carro passava por nós. Com aquele alto barulho provocado pela peça que tínhamos guardada, alertávamos o motorista com gritos: “olha a calota, moço; a calota caiu!”
O indivíduo parava o carro bruscamente para pegar a pretensa peça que havia se desprendido do seu carro e nunca ia examinar no carro se suas calotas estavam lá. Nesse momento, um dos garotos da turma pegava a tal calota velha e estragada e saía correndo, como se estivesse fugindo com a peça do carro do desavisado.
O motorista, quando via esse teatro com a tal calota, não pensava duas vezes e saía feito doido correndo atrás do garoto que, é claro, conhecia muito bem todos os esconderijos da região. O cara largava o carro no meio da rua, de porta aberta, e corria atrás do pretenso ladrão, que ele jamais encontrava, e voltava xingando na direção dos garotos que continuavam sentados no meio-fio da rua.
Para deixar o motorista ainda mais nervoso, estávamos todos morrendo de rir e quando ele se aproximava ameaçando chamar a polícia e querendo saber quem era e onde estava o ladrão que sumiu com a peça do seu carro. Para acalmá-lo, íamos logo dizendo: “confira lá o seu carro e olhe se está faltando alguma calota!”
De maneira geral, a grande maioria dos motoristas, depois de bufar bastante e xingar, acabava dando risadas ao perceber que havia sido pego em uma brincadeira de moleques. Mas sempre existiam aqueles mais exaltados, que queriam nos pegar pelo braço ou pelo colarinho para chacoalhar e mostrar onde estava o ladrão da calota de seu carro.
O mais engraçado de todas essas histórias é que alguns carros nem tinham calota. Porém, mesmo assim o pobre motorista freava e saía correndo atrás daquele moleque que estava com um caco de calota velha, que não servia para absolutamente nada. Coitado: na preocupação de não ser roubado, nem se dava conta de que seu carro não tinha calotas e, portanto, não poderia perdê-las. Mesmo assim, corria, xingava e blasfemava pela a peça “perdida”.
Atualmente, essa brincadeira de mal gosto não teria muita razão de ser. As calotas, em sua quase totalidade, são feitas de plástico e, quando saem das rodas por causa de um buraco ou por estarem mal encaixadas, se perdem sem que o motorista se dê conta. Quando percebe, o carro já está sem o acessório e com a roda desnuda, não tendo a mínima noção de onde ela caiu e foi perdida.
Além disso, as frágeis calotas plásticas, quando se soltam, em boa parte das vezes se quebram e ficam inutilizadas. Os moleques que fossem brincar, hoje, de jogar calotas correriam o risco de ter sua vida ameaçada, pois atualmente muita gente anda armada e não se intimidaria em agredir, mesmo que fosse uma criança de 10 ou 12 anos em uma brincadeira.
No meu tempo, era divertido para a molecada e, no final das contas, também para o motorista, que acabava rindo do corre-corre. Hoje, colocaria em perigo a garotada e até, quem sabe, o motorista enganado. O fato é que, no meu tempo de moleque, toda a turma deu muita risada com as reações mais diversas dos motoristas. Passávamos as tardes enganando os pobres coitados que passavam, desavisados, em nossa rua. Bons tempos!
Foto Shutterstock
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